“Os cientistas dizem que somos feitos de átomos, mas um passarinho me diz que somos feitos de histórias”.
Eduardo Galeano
Há alguns anos atrás comecei uma lista para anotar todos os livros que lia. Ao final do primeiro ano registrando, levei um susto ao perceber que apenas um havia sido escrito por uma mulher (e ainda era sobre educação de crianças!). O restante ou eram de brasileiros ou de britânicos e americanos. Como você deve imaginar, todos eles brancos.
Desde então, tenho procurado aumentar a diversidade de tudo o que leio e também alimento uma lista no Skoob com tudo que me interessa para quando quero escolher a próxima leitura. E também, sempre faço e pesquiso listas de autores para ter contato com obras que outras pessoas recomendam. Estou mencionando Literatura porque é uma das linguagens artísticas que mais consumo, mas você pode mensurar essas reflexões para o seu cotidiano.
Uma das coisas que pretendo fazer (a longo prazo) é ler pelo menos um livro de cada país. Nessa minha busca por descobrir outros jeitos de contar histórias além daqueles que estava habituada, encontrei referências que sempre me inspiram e me vêm na mente quando falo sobre assuntos semelhantes.
Um deles é “À Sombra da Figueira”, de uma escritora cambojana chamada Vaddey Ratner. A história se passa durante o regime do Khmer Vermelho e os personagens e eixo central da história giram em torna da relação entre um pai e uma filha. O contexto também foi vivenciado pela autora e os relatos históricos que ela transforma em Literatura realmente conseguiram ampliar minha visão de mundo ocidental. Apesar de contextualizar esse período turbulento e pesado da história de seu país, a poética e a profundidade com que transforma as palavras, por muitas vezes encheu meus olhos de lágrimas.
“As palavras nos permitem fazer permanente aquilo que é essencialmente transitório. Transformar um mundo cheio de injustiça e dor em lugar bonito e lírico. Mesmo que só no papel.” Vaddey Ratner
Outro que também quero compartilhar é “Como o soldado conserta o gramofone”, escrito pelo bósnio Saša Stanišic. O autor fugiu da guerra ainda criança e seu livro é uma ficção com notas autobiográficas. O personagem que nos apresenta o contexto do país, antes e durante a guerra é uma criança, mostrando que as guerras podem destruir tudo, menos a imaginação. Com trechos muito bem construídos poeticamente, nos apresenta outro olhar além de tudo que aprendemos na escola sobre essa região. Os personagens humanizam a nossa experiência quando nos fazem refletir sobre o mundo e a sociedade. Ler outras histórias é como tocar pequenos fragmentos de humanidade compartilhados conosco.
Você já parou para pensar o que tem alimentado seu repertório?
A nossa visão de mundo é construída pelas nossas referências e pelo repertório que construímos. Se tivermos contato somente com artistas da nossa bolha, nossas criações também serão limitadas. Quanto mais ampliarmos nossos horizontes, mais coisas interessantes poderão ser vislumbradas nas coisas que criamos. Sejam histórias, personagens ou cenários.
Tem dois TEDs que me inspiram sobre tudo isso que falei e que você pode se interessar também:
O primeiro é com a Chimamanda Adichie, uma escritora nigeriana falando sobre sua experiência com os livros que tinha acesso em sua infância, entre outras coisas bem importantes:
E o outro é com Ann Morgan, abordando a experiência de ler livros de outros países quando percebeu a lacuna em sua estante (e vida!) somente com livros britânicos e americanos:
Espero que este texto te inspire a explorar muitas novas histórias e muitas artes além do seu contexto cotidiano. 🙂
Comentários 3
Ai que lindo! Eu já estava com uma meta de comprar um livro por mês, agora depois de ler esse artigo vou acrescentar a essa meta mais duas a longo prazo: ter na minha biblioteca pelo menos um livro de uma escritora de cada estado do Brasil e ler pelo menos um livro de cada país do mundo! <3
Eu amei esse texto! É extremamente importante considerarmos nossas referências na criação de mundos, pq a grande verdade é que já temos milhões de reinvenções dos Grimm, mas muito pouco de lendas brasileiras, nigerianas, indianas etc. <3
Nossa, isso é muito importante! Ampliarmos nossos horizontes, principalmente para lugares que nos é mais distante culturalmente.